Um pouco de muito,talvez muito de nada (para alguns)
I was spending my time in the doldrums
I was caught in the cauldron of hate
I felt persecuted and paralyzed
I thought that everything else would just wait
While you are wasting your time on your enemies
Engulfed in a fever of spite
Beyond your tunnel vision reality fades
Like shadows into the night
To martyr yourself to caution
Is not going to help at all
Because there’ll be no safety in numbers
When the Right One walks out of the door
Can you see your days blighted by darkness?
Is it true you beat your fists on the floor?
Stuck in a world of isolation
While ivy grows over the door
So I open my door to my enemies
And I ask could we wipe the slate clean
But they tell me to please go fuck myself
You know you just can’t win
Pink Floyd – Lost for words
Que curioso é o cérebro humano. Como será possível ter lembranças do inexistente? Recordar aquilo que nunca foi? Talvez tenha sido verdade, mas em outro plano de existência: no olvido… Diz certa música espanhola: ‘como los malos maridos, cuando en el olvido pensamos en ti’. As calmas ondas dessa baía cantam junto à Praia, as lembranças aparecem. Mas elas não são, não foram, não existem… Lembranças daquilo que nunca existiu. Que confuso é o cérebro humano.
Será o ‘largo olvido’ de Neruda… Quão curto fazemos ser aquele primeiro, mas como se faz longo este último. Mas é a realidade que se nos apresenta. Aquela que é a nossa própria formação como ser, como pessoas. A nossa contextualização intelectual e moral. São as nossas experiências de vida, nossas leituras e vivências que acabam por formar o modo como vemos a vida. Aquela maneira como nos comportamos para com as pessoas, como nos relacionamos.
Coisas pequenas que engolimos, deixamos acumular e acabam por nos embrutecer. O tal muro, aquele mesmo que nos separa do real, dos sentimentos e nos impede de, às vezes, ver as coisas mais claras. Talvez um medo que nos faça criar este muro. Algo incontido, mas que possui um grande significado para nós mesmos. Um significado, aliás, que só faz total sentido em contexto, contextualizado com a nossa realidade individual. Realidade, por certo, que parece sem sentido, mas só pode ser entendida dentro de um, individual, sentido.
Dizia Baudrillard, citando a Ecclesiastes, ‘o simulacro não é aquilo que esconde a verdade; é a verdade, de fato, que esconde o fato de que ela própria não existe. O simulacro é a verdade’. A nossa verdade, que nem sempre faz sentido…
Cega-nos essa verdade, impede-nos de ver aquelas coisas como de verdade são. Machucamos, ignoramos, fechamo-nos detrás de nosso muro. Como é difícil às vezes derrubá-lo. Quão ignorantes nos pomos frente à nova realidade que nos apresenta. O medo, o inconsciente, a dúvida… Medo de nós meses talvez. Ou talvez nem isso, reações inesperadas e não planejadas.
Pensar que novas memórias de outrora se formam. Saber que elas selecionam momentos, criam emoções e fantasiam situações que nunca foram… Quão longo é o olvido… Que confuso é ser humano. Notar as coisas quando se as perde. Valorizá-las quando de verdade já foram: deixaram de ser. Saem do mundo táctil e se transferem para o plano das idéias, um plano egoísta e individualista. Pobre velho filósofo grego, que dura deturpação de sua realidade, daquele mito que propunha.
Lembro-me da velha lenda das bonecas russas, tão bem retratada na obra homônima do cinema. Fora encontramos a boneca na sua forma principal, não satisfeitos, entretanto, vamos mais a fundo. Tiramos a casca principal, encontramos a mesma boneca anterior. Ainda insatisfeitos, tiramos outra e encontramos com uma nova ‘casca’, mas é a mesma !? Seguimos ate que, ao final, atingimos a boneca em sua forma original: aquela mesma que tínhamos da primeira vez. Aquela mesma forma que originalmente gostamos. Mas seguimos buscando, abrindo, tirando, desgastando, corroendo, maltratando e deixando, ao final, uma pequena amostra do que seria o todo. Destruímos a boneca em sua essência mais pura, buscando justamente quem era. Ou simplesmente buscavamos a nós mesmos refletidos na boneca. Mas nós já estávamos ali em seu sentimento, apenas não nos víamos… Porque às vezes ‘narciso acha feio o que não é espelho’. Quão individualista e egoísta é Narciso…
Lendas, metáforas, dramatizações, falta de contextualização. Confusão nessa forma de comunicação, mas nada mais é que um texto individual. Idéias ou um método de autopunição para alguém que errou em muitas coisas. Um modo de tentar corrigir, uma maneira que se encontra de mudar, porque alguém despertou este sentimento de mudança.
Talvez um sentimento o tenha feito. Um sentimento de perda, de tristeza, de surpresa pela dimensão destes, e encantamento pelas lembranças daquilo que nunca existiram. Certas lembranças sempre foram, mas aparecem só no olvido. É que muitas vezes, mesmo nos abraços, a demonstração daquele uníssono (os dois em um), jamais houve. Um bloqueio, um sentimento impedido, o muro que não foi detido…
É como a velha história do Paxá que, cruzando o oceano em um mar com tormenta, possuía em seu barco um escravo que desconhecia o mar. Temeroso pelo poder daquela imensidão azul, o escravo gritava e se estremecia pelos riscos que achava que se aproximavam. Sem mais saber o que fazer, O Paxá chama um pensador que, de pronto, manda que lhe atirem ao mar. Os demais escravos obedecem à ordem para, logo em seguida, receber instruções que se lhe ice de volta. Outra vez no barco, este mesmo escravo se põe confortavelmente em um dos cantos e, calado, segue a viagem. Mas qual o segredo do pensador para confortar o escravo em seu medo tremendo, quer saber o Paxá? Este lhe responde:
‘Antes de ter uma amostra de afogamento, ele não poderia apreciar a abençoada segurança de um navio.’
Lembro-me de uma útil frase oriunda de uma antiga oração budista do séc. VIII (pelo que me consta). Nada mais coerente que usar essa frase para fechar essa historia, diz a antiga oração, adaptada ao japonês:
Shikin Haramitsu Daikomyo – Cada esperiência é sagrada, e traz em si a chave para a iluminação…